
Bem que têm se ouvido falar dos Lençóis, mas com certeza são poucas as pessoas que se aventuraram em conhecê-los. Uma região com uma extensão de 1.500 km², o que equivale a quase duas vezes o município de São Luís, capital do estado do Maranhão, ou sete vezes a área de Recife. Barreirinhas, o portal dos Lençóis, dista 257 quilômetros da capital, com um trajeto de ônibus ao redor de quatro horas e meia. Neste percurso, a parada obrigatória para descanso e lanche é um restaurante em Morros. Sempre muito frequentado. Vale a pena passar por lá. Ao chegar em Barreirinhas, o turista se depara com ruas tortuosas, quase sempre não pavimentadas, e um intenso ambiente comercial. As ruas estão lotadas de mochileiros e de pick-ups 4×4.
Há de se crer que, depois do Afeganistão, foi nos lençóis que a Toyota e a Mitsubishi encontraram seu maior cliente para as camionetes e os quadriciclos. Sem esses, andar nas areias seria uma missão extremamente difícil. O interessante, porém, não é se deter em Barreirinhas, mas ir até o distrito de Atins, local onde se encontra o cenário natural em seu formato menos alterado pela atividade humana.
Se em Barreirinhas o planejamento urbano é insuficiente, em Atins ainda está para chegar. São dezenas de ruas, vielas e becos que formam esta comunidade. Somente quem nasceu em Atins ou anda por lá com frequência consegue saber para onde vai. Sem um bom guia, é melhor não se atrever e muito menos andar a pé. A vegetação é um verde exuberante em pleno areial.
A natureza e seus contrastes
A beleza da viagem está na expedição às dunas e lagoas. Este ano, as chuvas foram menos abundantes e o acúmulo de água não foi suficiente para preencher a maior parte das lagoas, contudo, não deixa de ser um espetáculo de beleza inigualável o confronto do deserto, representado pelas dunas, seus oásis, as lagoas e o mangue. Vegetação de locais encharcados de uma exuberância pouco vista em outros locais com esta cobertura vegetal. Cada pessoa tem uma relação especial com a paisagem dos Lençóis. Provavelmente, alguns irão destacar a foz do Rio Preguiça com o mar. Por falar nisto, não duvido que os irmãos maranhenses queiram algum dia reivindicar o fato de que somente este rio pouco conhecido contribua para a formação do oceano Atlântico com uma vazão maior do que o Capibaribe e o Beberibe, juntos. O fato é que este estuário, além de bonito, é muito pouco povoado, tornando-o ainda mais atrativo. Outros ficarão encantados com a altura do manguezal e a presença da carnaúba e de outras palmeiras. Alguns se encantarão com as lagoas de água doce, variando a tonalidade e transparência entre uma e outra. Já para outro grupo, o que mais atrai aos olhos e à alma são as areias que fazem lembrar o Saara.
O deserto tem uma magia indescritível. Não é para beduíno de primeira viagem se adentrar no mar sólido e conseguir ir e vir sem perder-se por completo. Abstraindo-se das águas e da vegetação, alguém há de se sentir no Marrocos, Tunísia ou até na Mauritânia, onde o deserto se confunde com o mar. O fato é que há espaço, forma e momento para todos os apreciadores da natureza ainda pouco violada.
O Maranhão e seus ciclos econômicos.
O estado do Maranhão, por alguns séculos, não chegou a ser conhecido apenas por sua cultura, seu português castiço, seus poetas maravilhosos, de Gonçalves Dias a Ferreira Gullar, mas também por uma pobreza endêmica que, apesar de alguns ciclos, a exemplo da cera da carnaúba e do algodão, ao final do século XIX, não conseguia decolar em matéria de desenvolvimento e bem-estar de sua população. Ainda há muito o que ser feito, entretanto, o estado consegue avançar em segmentos como a mineração, sendo um dos principais exportadores de minérios através do porto de Itaqui; com uma agricultura comercial em expansão na região do Sul, onde extensos campos de soja, milho e algodão são comuns à paisagem e, mais recentemente, com o turismo que cresce em São Luís, uma cidade cujo centro histórico é tão grande ou maior do que os das cidades do Rio de Janeiro, Salvador ou Recife-Olinda e que ainda guarda traços marcantes da cidade que foi há cinquenta anos.
Mas não é só de economia que vivem os povos, talvez seja o principal indicador civilizatório de uma comunidade. E aí está a cidade, nacionalmente conhecida como capital do Reggae, do samba e do bumba-meu-boi, cobra de todos nós o desconhecimento deste país rico e tão pouco conhecido. Há cerca de vinte anos, tive a oportunidade de conhecer um cantor maranhense, Papete, que já nos deixou com sua música e poesia inigualável. Quem ouviu Boi Catirina ou Dente de Ouro, sabe bem do que trata esta magia. Pena que não seja possível conviver com este povo e provar um pouco do que tem de melhor em muito pouco tempo.
Por último, a culinária do litoral maranhense se caracteriza por uma riqueza diferenciada de frutos do mar. Para quem aprecia e gosta do camarão marinho ou de peixes como o robalo e a pescada amarela, não há local onde se veja tanta fartura. Agora entendo o drama de se viver distante deste mundo encantado.
A presença de turistas europeus
Outro fato relevante diz respeito à presença marcante de turistas europeus nos Lençóis, destacando-se italianos e franceses. Não sei como se deu a descoberta recente dessas duas nacionalidades. Os franceses, pelo fato de terem estado presentes e contribuído para a formação histórica e cultura do povo maranhense, pode-se justificar, mas esta forte presença de jovens italianos e italianas me deixou questionando como descobriram Barreirinhas e Atins. O fato é que estão aqui e espero que passem uma boa impressão do que viram.
Professor titular da UFRPE-UAST





