• Como é a vida em quilombo ameaçado por possível expansão da base de Alcântara (MA)

    ALCÂNTARA (MA)

    Toda vez que o CLA (Centro de Lançamento de Alcântara) arremessa um foguete ao espaço, os moradores do quilombo Mamuna ficam cientes. Não necessariamente por aviso do instituto ou notícia em jornal, mas porque o chão de toda comunidade estremece.

    É assim desde 1990, ano do primeiro lançamento da base aeroespacial de Alcântara (MA). De todos os centenas de povos que compõem o município, a comunidade de Mamuna é a que está mais próximo da área. É como se fosse vizinha da instituição.

    Responsável pelo CLA, a Força Aérea Brasileira afirma que o risco de um foguete atingir a comunidade é baixo. Mesmo assim, a moradora Maria José Lima Pinheiro diz temer a vibração da terra.

    Esse medo, no entanto, está longe de ser a maior preocupação de dona Maria —nome pelo qual é conhecida. Parte de uma geração que cresceu ouvindo que seria despejada a qualquer momento, ela afirma estar hoje, aos 50 anos, menos ansiosa do que na juventude, mas ressalta ainda ter horror à ideia de ser expulsa do lugar onde cresceu.

    “O medo deu uma trégua. Antes, a gente era muito apavorado”, diz a maranhense. “Se Mamuna for realocada, todas as outras comunidades serão. É estilo dominó.”

    Maria José Lima no quilombo Mamuna, em Alcântara (MA) – Danilo Verpa/Folhapress

    A quilombola se refere às especulações de uma possível ampliação da base, o que provavelmente faria Mamuna ser transferida para outra região, como aconteceu com vários povoados na instalação do CLA, na década de 1980 —ao menos 312 famílias, de 32 comunidades, foram realocadas de forma compulsória, num processo que se tornou um dos casos mais emblemáticos da causa quilombola no país.

    Em 2019, a Folha revelou que o plano mais recente de ampliação do CLA —baseado num acordo firmado por Bolsonaro com os Estados Unidos— previa a remoção de 350 famílias quilombolas de Alcântara, ao contrário do que prometia o então ministro Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia).

    Em 10 de abril daquele ano, ele disse em uma comissão da Câmara dos Deputados: “Quanto à pergunta sobre se haverá a expansão da área, devo dizer que não. A área estabelecida do centro é aquela já definida. Não existe uma questão de expansão”.

    “O que tranquiliza é saber que só vamos sair daqui se Deus permitir”, afirma dona Maria. “Deus está acima de todos eles.”

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